Não basta seguir à risca a legislação ambiental para ser sustentável. Ser eco-eficiente nos meios de produção atenua impactos, mas não resolve a questão. A obtenção de selos e certificações confirma o compromisso de fazer o melhor possível, mas fazer o melhor possível nem sempre é o suficiente. É dura a constatação de que a sustentabilidade – entendida como conceito central de um modelo econômico, político, social, cultural e ambiental equilibrado, que satisfaça as necessidades das gerações atuais, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades – ainda é uma utopia.
Estamos à procura de um novo modelo econômico que assegure ao mesmo tempo a produção de riqueza bem como a geração de emprego e renda. Uma alternativa ao sistema hegemônico no mundo, e descrito há quase 18 anos no relatório final da Rio-92 como um modelo de desenvolvimento “ecologicamente predatório, socialmente perverso e politicamente injusto” –
Mas enquanto as ciências econômicas não perceberem o óbvio – os limites estabelecidos pela capacidade de suporte do planeta e os riscos inerentes ao colapso dos ecossistemas, amplamente denunciados pelas comunidades científica e acadêmica – continuaremos privilegiando o velho e surrado mantra do capitalismo que elege o melhor negócio como sendo aquele que promove a maximização dos lucros no menor intervalo de tempo possível. Evidentemente que isso não é sustentável. O “business as usual” preconiza horizontes sombrios no longo prazo em detrimento de uma pretensa altíssima taxa de retorno do capital investido no curtíssimo prazo. É preciso fazer uma escolha, como adverte o economista Eduardo Giannetti da Fonseca no excelente livro “O Valor do Amanhã” (Companhia das Letras, 2005). Trata-se de uma escolha ética, capaz de inspirar novos modelos de planejamento onde a justa pretensão do lucro se adeque aos novos tempos. Como nos adverte o professor Ladislau Dowbor, da PUC/SP, “crescer por crescer é a filosofia da célula cancerosa”. As críticas consistentes ao produtivismo abrem espaço para novos rumos de investigação científica na direção de expressões bastante sugestivas como “decrescimento” ou “retirada sustentável”.
Qual a civilização que queremos? A que reforça as expectativas de que para sermos felizes precisamos consumir, um dia, o que um americano médio possui (mesmo sabendo de antemão que não há planeta suficiente para isso)? Ou podemos almejar outro modelo civilizatório, onde todos tenham direito a uma vida digna e plena, com a satisfação de suas necessidades básicas – alimentação, saúde, moradia, educação, lazer, etc – e a chance de cada um poder desenvolver suas potencialidades? Nessa civilização, os meios de produção seriam capazes de satisfazer necessidades demarcadas por uma realidade inexorável: ou a economia se ajusta aos limites do planeta, ou não haverá planeta para suportar a economia.
Os impressionantes recordes do PIB chinês, incensados por quem insiste em perceber a situação econômica de um país a partir de um indicador estreito de percepção da realidade, não embutem externalidades que começaram a preocupar o próprio governo daquele país. A péssima qualidade do ar, a exaustão dos nutrientes do solo, a escassez de recursos hídricos e um regime de trabalho que suprime direitos assegurados na maioria dos países desenvolvidos configuram um mosaico que levou o Congresso do Partido Comunista chinês a reconhecer em 2007 a importância da “Perspectiva Científica para o Desenvolvimento” e da proposta de desenvolver uma civilização “ecológica”. Como resumiu Fei Yunliang, delegado do PC chinês na ocasião : “O crescimento às custas do meio ambiente e da ecologia violou as normas de desenvolvimento, prejudicou a produtividade e certamente poderá gerar um retrocesso”. O gigante chinês é hoje o mais fiel retrato desse momento de transição entre dois modelos de desenvolvimento.
Se a China já ultrapassou os Estados Unidos nas emissões globais de gases estufa (tal como os EUA, a principal fonte de energia dos chineses é o carvão mineral), também é verdade que o país lidera os investimentos em energia eólica, solar e no chamado “carvão limpo” (clean coal). O que está por trás de toda essa nova cadeia de investimentos na China é o risco de o país perder mercado num futuro próximo onde a economia de baixo carbono ganha prestígio e escala, e também o desejo de reduzir o desperdício e a dilapidação do capital natural já expressos numa conta feita em 2004 pelo regime : naquele ano, a poluição custou à China mais de 3% de seu PIB, algo em torno de U$ 64,3 bilhões.
Como se vê, mudar a cultura gerencial, o jeito de fazer negócios e de se planejar os rumos de uma empresa não são uma opção, uma alternativa ou um capricho. Esta nova dimensão ética já é realidade onde exista a compreensão de que aquilo que não for bom para todos, não será bom para ninguém.
André Trigueiro
(artigo escrito para a Revista Opiniões em 12/10/2010)