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É pra comemorar a descoberta de uma bactéria que devora garrafas PET?

 

Descobriram no Japão uma bactéria que devora garrafas PET. O microrganismo foi encontrado por acaso numa usina de reciclagem e, segundo pesquisadores da revista “Science”, uma colônia dessas bactérias é capaz de degradar uma folha fina de PET em 6 semanas.

A descoberta foi anunciada com estardalhaço mundo afora, como uma possível solução para as 50 milhões de toneladas de PET que descartamos a cada ano, das quais apenas 15% seriam recicladas.

Devo dizer que me sinto envergonhado, enquanto espécie, de “comemorar” a descoberta de uma bactéria que poderia resolver um problema criado pela sociedade de consumo. O culto ao descartável permanece intocável, inquestionável. Testemunhamos bestificados o crescimento em progressão geométrica de montanhas de lixo equivalentes em tamanho ao nosso analfabetismo ambiental. E não parecemos incomodados com os gigantescos transtornos causados pela incapacidade do ecossistemas “metabolizarem” tudo isso.

Anunciada como uma panacéia, a tal bactéria ainda está longe de ser considerada uma “aliada” para desaparecer com bilhões de embalagens abandonadas por aí. Suas enzimas digestivas precisariam ser domesticadas para dar conta de tanta calorias plásticas. Não se sabe ainda exatamente quais os riscos que isso representaria para nós e para os ecossistemas. Os minúsculos fragmentos do banquete (a bactéria deixaria restos de PET pelo caminho) poderiam impactar os ciclos de vida no universo microscópico. Além disso, ávidos de lucro, os financiadores de pesquisas na área da biotecnologia nem sempre parecem dispostos a seguir os protocolos da bioética. Há precedentes perigosos – especialmente em relação ao licenciamento de produtos transgênicos – que inspiram cuidado.

Mas a parte mais incrível dessa história foi a resposta da natureza aos impactos causados pelo PET. Diante de nossa indiferença criminosa, coube a Gaia (deusa da mitologia grega que seria a Mãe-Terra) desenvolver num intervalo de tempo relativamente curto – em apenas algumas décadas – um pequenino ser vivo com esta característica curiosa: se alimentar quase que exclusivamente de PET.

Será que o software inteligente da vida (ou Gaia, como queiram) será capaz de rastrear a origem desse e de outros problemas que ameaçam a resiliência do planeta? Da mesma fonte misteriosa de onde veio a “bactéria que devora PET”, poderiam surgir outros microrganismos capazes de eliminar os responsáveis por tanta destruição?

Melhor não arriscar.

Por vida das dúvidas, consuma com consciência e descarte de forma inteligente e responsável os seus resíduos.

Gaia agradece.

 

André Trigueiro

 

 

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