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A ‪COP21‬ e a reunião do condomínio

 

O acordo final da COP-21 em Paris pode ser comparado ao estatuto de um condomínio em crise. Convoca-se uma reunião dos moradores para discutir o risco de o prédio desabar por conta do colapso nas estruturas. A situação é grave e exige providências imediatas. A assembléia se transforma em uma exaustiva maratona que dura duas semanas. Ao final do encontro, os moradores celebram a aprovação do texto do novo estatuto que deverá agilizar a tomada de decisões no futuro. Mas o risco de colapso estrutural do prédio continua. E o novo estatuto não alcança esse senso de urgência.

Voltando para Paris. Será possível anunciar um acordo que seja ao mesmo tempo “audacioso e equitativo”, como disse o Presidente da #COP21 Laurent Fabius? Audacioso remete a algo diferente de equitativo. Mas os delegados dos 195 países reunidos no Centro de Convenções em Paris aplaudiram. Após a maratona de duas semanas de intensas negociações, com riscos reais da COP-21 repetir o fracasso da COP-15 (que entrou para a história como o maior fracasso diplomático dentre todas as COPs) alguém poderá dizer que “não retroceder é avançar”.

O primeiro acordo global vinculante do clima (o Protocolo de Kioto em 1997 estabelecia objetivos apenas para os países ricos e industrializados) é um feito histórico, não há dúvida, mas quais os resultados práticos para o combate ao aquecimento global?

Baixar o sarrafo para 1,5°C como limite ideal de elevação da temperatura neste século é maravilhoso, mas o texto não indica como isso vai acontecer. Simplesmente não há garantias de que esse objetivo seja alcançado. Hoje a concentração de CO2 na atmosfera supera as 400 ppm (com o agravamento do efeito estufa em um ritmo preocupante), e as projeções dão conta de que, nesse ritmo, a temperatura média do planeta ultrapasse com facilidade os 2ºC (antigo patamar que servia de referência nas negociações). Ou seja, para que se promova a inflexão da curva de emissões a Humanidade precisará empreender esforços ainda maiores, monumentais, e rápido. Mas não há garantias no acordo de que isso vá mesmo acontecer.

Avaliar os compromissos assumidos voluntariamente pelos países a cada 5 anos é uma novidade positiva, mas não há metas de redução claramente definidas na linha do tempo (até 2020, 2030, 2050…) além daquelas apresentadas voluntariamente por alguns países, cada um fazendo a conta do seu jeito, e que somadas estão longe de alcançar o principal objetivo do acordo expresso no novo limite de elevação da temperatura.

Para o Diretor Internacional do Greenpeace, Kumi Kadoo, o texto do acordo de Paris “relega claramente a indústria de combustíveis fósseis ao lado errado da História”. Em sendo mesmo o lado errado da História, por que os países que assinaram o acordo repassam aproximadamente U$ 700 bilhões em subsídios a cada ano para as indústrias de carvão, petróleo e gás?

Diante disse, podemos realmente afirmar que a História já começou? Quando esses países se sentirão no “lado errado da História” e contribuirão para a efetiva redução das emissões de gases estufa?

“Foi o acordo possível”, alguém dirá. Eu acredito. Mas o prédio continua torto.

André Trigueiro

 

 

 

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