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Papa Francisco aprofunda discussão sobre clima, em encontro no Vaticano

 

Por José Eduardo Mendonça

Fonte: Planeta Sustentável

 

Papa Francisco tem surpreendido o mundo com seu discurso progressista sobre uma série de questões controvertidas, como sexualidade, contracepção, aborto e as distorções do capitalismo, ou o desperdício de alimentos e a fome no mundo. Mas, desde o começo de seu pontificado, mostrou preocupação enfática com a natureza e amudança do clima.

Na homilia da missa inaugural de seu pontificado, em março de 2013, reiterou o exemplo de São Francisco de Assis, de proteção da natureza como dever sagrado. No final do ano seguinte, enviou mensagem clara aos participantes da Conferência do Clima da ONU em Lima, no Peru, a COP20: “O tempo para encontrar soluções globais e está se esgotando. Só poderemos achar soluções adequadas se atuarmos juntos. Existe, portanto, uma clara, definitiva e inadiável ética de atuar”, asseverou o pontífice.

Ontem, 28/4, em Roma, a preocupação foi especificamente com as mudanças climáticas. Francisco convidou cientistas, figuras religiosas e políticos para reunião no Vaticano (como noticiamos neste blog), a fim de discutir o aquecimento global e seu impacto sobre os mais pobres no mundo. Como se sabe, o papa prepara carta encíclica para os bispos, que será traduzida do latim para outras línguas para divulgação em setembro – portanto, quatro meses antes das negociações do clima em dezembro, em Paris.

Na organização do evento, ele foi aconselhado por dois grupos de estudiosos de assuntos científicos do Vaticano. A Pontifícia Academia de Ciências já tinha feito diversas conferências sobre o assunto: uma em 2011 sobre o derretimento das geleiras e outra, em 2012, sobre desenvolvimento sustentável. O encontro de agora foi o primeiro a incluir líderes religiosos de diversas crenças.

Cerca de 25 pessoas – representando religiões como protestante, ortodoxa, judaica e muçulmana – se encontraram com Paul Crutzen (Nobel de Química em 1995), o climatologista James Hansen e o ex-presidente da Real Sociedade Britânica Martin Rees, junto com o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, e o presidente italiano Sergio Mattarella, além do importante economista Jeffrey Sachs.

Peter Raven, cientista do Jardim Botânico do Missouri, e um dos organizadores do evento, disse que o Papa é crucial para angariar apoio público às políticas de emissão de gases de efeito estufa (GEE). “O único meio de políticos conseguirem um acordo é convencê-los de que um número suficiente de pessoas se preocupa com a questão”, afirmou. “E isto vai acontecer apenas se existir um forte componente ético”. É exatamente nesta tecla que bate o pontífice.

Entre os argumentos morais para se agir e evitar intensificação da mudança do clima está a ideia de que a sociedade deve preservar a Terra para as gerações futuras, diz outro organizador do encontro, o cientista do clima Veerabhadran Ramanathan, da Instituição Scripps de Oceanografia, da Califórnia. Outro é que os 3 bilhões de pobres do mundo produzem uma pequena fração dos gases de efeito estufa emitidos no mundo – cerca de 5% -, mas serão os mais atingidos pelos impactos que causam, como o tempo extremo, afirma Francis Beinecke, ex-presidente do Conselho de Defesa dos Recursos Naturaisdos EUA.

Por estas razões, a conferência recebeu o título de Proteger a Terra, Dignificar a Humanidade. A Dimensão Moral das Mudanças Climáticas e o Desenvolvimento SustentávelSegundo o Papa Francisco, trata-se de um imperativo moral já que a mudança do clima é uma crise humanitária que atinge a todos. Seu engajamento, e agora sua convocação, produzirão repercussões importantes.

Acredita-se que, até o fim de seu mandato, o pontífice vai chamar muita atenção sobre o assunto, o que seus predecessores não conseguiram. E parece estar conseguindo o intento. Na última segunda-feira, 27/4, conservadores  convocaram entrevista coletiva à imprensa para condenar a posição do papa, que consideram muito progressista (e contra seus interesses econômicos, claro). Um dos participantes foi Christopher Monckton, ex-assessor da ultra-neoliberal ex-primeira-ministra Margaret Thatcher. “O papa está sendo enganado pelos ‘especialistas’ das Nações Unidas, que não merecem confiança”, disse Joseph Bast, presidente da organização de direita Hartland Institute, e um dos organizadores da coletiva.

“Hoje, a acelerada queima de combustíveis fósseis que move a economia está perturbando o delicado equilíbrio da Terra em escala quase inimaginável”, contrapõe o cardeal Peter Tuckson, de Gana, membro do círculo mais próximo do papa. “Os países mais ricos, aqueles que mais se beneficiaram dos combustíveis fósseis, têm a obrigação moral de encontrar soluções para o clima e proteger o ambiente e a vida humana”, afirmou.

Ban Ki-moon, que teve um encontro reservado com o papa, disse que a encíclica, com informações detalhadas sobre o estado do clima, “vai dizer ao mundo que a proteção do ambiente é um dever sagrado para pessoas de todas as crenças”. Como pregava São Francisco de Assis.

 

 

 

Postado por Daniela Kussama

 

 

 

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