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A farra da retirada ilegal de areia e saibro no RJ

 

Fonte: G1

 

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Uma das principais construções de legado do Rio para as OIimpíadas de 2016, a Transolímpica, usou saibro extraído de forma ilegal. O Fantástico acompanhou operações policiais para desmascarar quem está por trás de crimes ambientais que abastecem o mercado de minério na Região Metropolitana. A reportagem foi exibida neste domingo (15) (veja no vídeo acima).

A equipe de reportagem registrou, na Zona Oeste da capital, uma retroescavadeira enchendo a caçamba de um caminhão com saibro – um tipo de argila usado na construção civil – retirado de uma encosta.

Além de as autoridades considerarem a área ilegal para extração, o destino do material é surpreendente. Por terra, a equipe seguiu um dos caminhões até o seu destino final, na Estrada do Catonho, altura da Colônia Juliano Moreira, em Jacarepaguá, onde foi confirmada a irregularidade.

O motorista do caminhão afirma que são pelo menos seis viagens por dia, até o canteiro de obras da Transolímpica.

 

Na mira da Justiça há 20 anos

A exploração na encosta de onde o saibro foi retirado está na mira da Justiça há mais de 20 anos. Em 1993, a CGA Locação de Máquinas foi condenada pela destruição de 10 mil metros quadrados de Mata Atlântica. A tentativa de punir os responsáveis pelo estrago durou mais de duas décadas.

Em 2014, Crispim Gomes Alberto e seu filho, Crispim Augusto Lourenço Gomes, finalmente fecharam um acordo com o Ministério Público estadual (MP-RJ) para recuperar o espaço.

O Fantástico descobriu que a licença ambiental usada por Crispim nessa nova fase, além de permitir novamente a exploração de saibro, foi bem mais generosa do que deveria: 19 mil metros quadrados a mais do que o limite estabelecido.

“Isso é estranho. Aconteceu três anos atrás, não foi na minha gestão, mas nós temos responsabilidade de apurar”, disse o secretário de Ambiente do Rio, André Corrêa.

O secretário disse que houve um erro no cálculo, causado por falha no sistema que mede a área, o GPS.

“Eu não sou especialista, mas o que eles dizem é que na transposição do sistema de coordenadas do DNPM [Departamento Nacional de Produção Mineral] para o novo sistema que o Inea adota em função de uma normativa, se deu um acréscimo. Mas ao examinar o caso concreto que vocês nos trouxeram, particularmente entendemos que esse acréscimo foi exagerado. E pela inspeção no local, nos preocupou.”

A Secretaria de Estado do Ambiente suspendeu a licença de exploração do terreno. E, nesta semana, o Ministério Público Federal denunciou Crispim por crime ambiental e pediu a suspensão das atividades da CMX3, empresa de Crispim que substituiu a CGA no controle da área. O MP também pediu o sequestro de R$ 2 milhões do empresário e instaurou um inquérito por suspeita de lavagem de dinheiro.

A Prefeitura do Rio afirmou que vai apurar o caso e pode punir o consórcio responsável pela obra.

O Fantástico entrou em contato com o empresário e ele chegou a marcar entrevista.
Mas, no sábado (14) à tarde, cancelou.

Área em Seropédica ficou cheia de crateras abertas a céu aberto (Foto: Reprodução/Globo)
Área em Seropédica ficou cheia de crateras abertas a céu aberto (Foto: Reprodução/Globo)

 

15% do município

Crispim é figura conhecida no DNPM. É o recordista de licenças para pesquisar as riquezas minerais da cidade do Rio de Janeiro. As autorizações e pedidos abrangem aproximadamente 15% de todo o município.

Isso inclui muitos locais de obras do legado olímpico, como os novos túneis do Elevado do Joá, o Parque Olímpico e o Complexo Esportivo de Deodoro.

“Na verdade é um grupo de empresas vinculado a uma mesma pessoa e esse grupo de empresas, hoje, ele é responsável por uma parte significativa dos processos que a gente tem aqui, principalmente processos de pesquisa”, disse Willians Carvalho, chefe da fiscalização do DNPM.

Segundo ele, são cerca de 400 processos. ”É muita coisa (…) É uma atividade especulativa, não é ilegal. Mas é especulativa (…) Normalmente, quando isso acontece, a pessoa se vale da desinformação. Ele tem um papel na mão, uma autorização de pesquisa, normalmente um alvará que é expedido pelo DNPM e ele costuma fazer algum tipo de pressão. Dizer que o subsolo pertence a ele, que ele tem direito sobre aquilo e, na hora de fazer a obra, ele pode tentar provocar algum tipo de retardo, dificuldade.”

Pela lei, qualquer pessoa pode entrar com o pedido de pesquisa de uma área, mesmo que não seja sua. Mas para explorar qualquer minério, é necessário entrar em acordo com o dono do terreno ou o assunto será resolvido na Justiça. Ou na polícia, quando há o envolvimento do crime organizado. No caso do Rio de Janeiro, a milícia.

“Nós percebemos que essas áreas que há forte influência de milícia, efetivamente há vastas áreas que desmatadas devido a extração clandestina e ilegal de saibro”, diz o delegado Alexandre Herdy, da Delegacia de Proteção às Ações Criminosas Organizadas.

O Fantástico acompanhou duas operações da Secretaria do Ambiente do Rio. Em Seropédica, Região Metropolitana, uma área equivalente a duas vezes o bairro de Copacabana se transformou num conjunto de imensas crateras a céu aberto.

No primeiro dia, os soldados foram escondidos na caçamba do caminhão, mas a operação foi descoberta. Para José Mauricio Padrone, coordenador de Combate aos Crimes Ambientais, “existe a suspeita de envolvimento de autoridades, políticos influentes e milicianos”. ”É uma organização criminosa”, explica.

No segundo dia, a polícia chegou de helicóptero e deteve três pessoas. Um deles já era conhecido da polícia, o operador de máquina Alex Santos Ferreira da Silva. “Não foi uma surpresa, porque eu já fui pego uma vez”, disse Padrone.

Quando se desconfia que há alguma operação policial na região, o grupo abandona de imediato as cavas e deixa para trás equipamentos considerados caros. Não há preocupação por parte dos bandidos porque o poder público não tem condição de confiscar e levar embora o material.

O crime é considerado de baixo potencial ofensivo. Para os policiais, o sucesso da operação é relativo. Os presos serão soltos e os equipamentos ficarão no mesmo lugar.

“É a certeza da impunidade. A gente está aqui, vai prender, vai pra delegacia, vai ser autuado, vai ser condenado, paga uma fiança rindo e volta para cá, para cometer o mesmo tipo de crime (…) Bom… Realmente o nosso trabalho é de enxugar gelo”, disse Padrone.

 

 

 

 

 

 

 

 

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