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Resposta ao aquecimento

É possível que você ainda não tenha se dado conta da situação, por isso, vale o aviso: os próximos anos prometem muitas emoções num planeta onde a temperatura vai subir, e o clima deverá se comportar de forma cada vez mais estranha.
A atual temporada de furacões nos Estados Unidos – e os prejuízos espetaculares causados por sucessivas tormentas – levou o presidente da Comissão Real Britânica para o Meio Ambiente, John Lawton, a afirmar que não há mais dúvidas de que o fenômeno está associado ao aquecimento global. 

Para Lawton, negar que as atividades humanas – principalmente a queima de petróleo, gás e carvão – estejam mudando o clima, seria o mesmo que negar as evidências de que o cigarro causa câncer.

De acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU, um colegiado internacional de cientistas que estudam o assunto, a temperatura da Terra deverá aumentar entre 1,4 e 5,8º C nos próximos 100 anos. Entre outras conseqüências, a elevação da temperatura deverá provocar a elevação do nível dos mares – entre 10 e 90 centímetros – e a mudança do ciclo das chuvas.

O aumento do nível de certeza em relação a essas previsões deveria inspirar mudanças importantes em diferentes setores da sociedade para atenuar os impactos que já estão acontecendo. No que diz respeito ao Brasil, há muito o que fazer. O planejamento urbano e as regras para o uso do solo nas cidades costeiras – sob a tutela dos prefeitos – precisam incorporar nos projetos o risco de o mar avançar sobre o continente.

Temos mais de 8 mil quilômetros de litoral que se revelam de forma desigual: praias, falésias, dunas e manguezais. Estudos recentes desenvolvidos por um grupo multidisciplinar de pesquisadores recrutados pelo Ministério do Meio Ambiente revelaram que aproximadamente 40% das praias brasileiras seriam mais vulneráveis ao avanço gradual do mar.

Em pelo menos 22 pontos da costa, da região Norte ao extremo Sul do país, essa vulnerabilidade é maior em manguezais, dunas e áreas densamente povoadas próximas de estuários, como é o caso de Rio de Janeiro e do Recife, que oferecem menos resistência ao mar.

A sugestão dos pesquisadores aos prefeitos de cidades litorâneas é a seguinte: toda nova construção em áreas urbanas deveria guardar uma distância mínima de 50 metros da praia. Nas regiões ainda desocupadas, a distância mínima deveria ser de 200 metros. São recomendações técnicas que, se respeitadas, poderão evitar grandes prejuízos num futuro próximo.

Uma outra medida importante é investir em sistemas de monitoramento do clima mais eficientes. Num cenário em que se prevê o aumento da freqüência e da intensidade das tormentas, não podem faltar recursos que garantam o conhecimento prévio do fenômeno. O violento temporal que castigou o Rio de Janeiro na manhã do último dia 23 de setembro surpreendeu os cariocas, que não foram avisados antecipadamente sobre a chegada da tempestade. Os meteorologistas do Sistema Alerta-Rio denunciaram à imprensa que o radar meteorológico no Pico do Couto (em Petrópolis), que poderia prever a chegada da tempestade com 3 horas de antecedência, estava desativado para reparos há mais de um mês. Será cada vez maior a demanda de eficiência e agilidade no repasse dos informes meteorológicos, principalmente no Sul do país, onde tivemos a primeira ocorrência de furacão de nossa história. E tudo leva a crer que o fenômeno Catarina não será o único na região.

Na esfera empresarial, o dever de casa começa pelas montadoras de veículos. Sendo os automóveis os maiores contribuintes de gases estufa nas cidades, seria ótimo que as montadoras brasileiras repetissem o exemplo da indústria automobilística da Califórnia, nos Estados Unidos, onde a cada nova geração de carros há menor consumo de combustível, mais autonomia, e principalmente metas audaciosas de redução de gás carbônico na atmosfera. Se há conhecimento técnico para reduzir as emissões dos motores, por que não fazê-lo de forma mais agressiva, em benefício de todos?

Nunca foi tão importante promover projetos de reflorestamento (árvores seqüestram carbono da atmosfera) e disponibilizar madeira e lenha certificados, com selo verde, recompensando os esforços de quem retira a madeira da floresta sem destruir a floresta, graças à aplicação dos planos de manejo.

A destinação inteligente dos resíduos sólidos também tem implicações importantes sobre o aquecimento global. No processo de decomposição da parte orgânica do lixo libera-se CH4 (metano), cuja capacidade de reter calor na atmosfera é 23 vezes maior que a do CO2 (dióxido de carbono). Por ser um gás combustível, o metano poderia ser aproveitado para gerar energia a partir dos aterros de lixo, como já acontece em São Paulo, que abriga a maior usina de energia sobre um aterro de lixo do mundo. O Aterro Bandeirantes oferece energia para 200 mil pessoas, com capacidade para dobrar a oferta.

Um levantamento feito pelo Ministério do Meio Ambiente mediu o potencial energético nos 37 maiores aterros de lixo no Brasil. De acordo com a pesquisa, a energia acumulada nestes aterros é suficiente para abastecer uma população estimada em 6 milhões e 800 mil pessoas. Em 2025, o estoque de biogás poderá atender 8 milhões e 800 mil pessoas. O equivalente à população de Pernambuco.

Os orientais nos ensinam que crise é sinônimo de oportunidade. Que o aquecimento global – talvez o maior problema ambiental do século 21 – possa abrir novos caminhos na direção da sustentabilidade, e ajustes importantes nos meios de produção e de consumo.

André Trigueiro é jornalista com Pós-graduação em Gestão Ambiental pela COPPE/UFRJ, Professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC/RJ, autor do livro “Mundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em transformação” (Editora Globo, 2005), Coordenador Editorial e um dos autores do livro “Meio Ambiente no século XXI”, (Editora Sextante, 2003).

 

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