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A paz é verde

A primeira mulher africana a ganhar o Prêmio Nobel da Paz é ambientalista. A queniana Wangari Maathai surpreendeu o mundo ao aparecer como a vencedora do prêmio no valor de U$ 1,38 milhão, concorrendo com gente graúda como o chefe da Agência Internacional de Energia Atômica e inspetor de armas da ONU, o egípcio Mohamed El Baradei.

“Essa é a maior surpresa da minha vida inteira”, disse Maathai ao ser informada da premiação. Na verdade, esta entusiasmada militante de 64 anos é uma colecionadora de títulos inusitados. Ainda jovem, teve a chance de completar os estudos fora do país. Formou-se em Biologia e fez mestrado nos Estados Unidos. De volta para o Quênia, tornou-se a primeira mulher a coordenar um departamento na Universidade de Nairobi. Vencendo o preconceito dos colegas – todos homens –, dirigiu a Faculdade de Medicina Veterinária, onde tornou-se a primeira mulher da África Central a alcançar o título de PHD. Hoje, Wangari Maathai é a vice-ministra do Meio Ambiente do Quênia.

Mas foi em 1977 que a doutora Maathai começou a chamar a atenção do mundo ao criar o Movimento Cinturão Verde. O objetivo era audacioso: recrutar mulheres negras e pobres para reflorestar o país. Com apenas 2% do território ainda cobertos de verde, o Quênia sofre com o desflorestamento acelerado causado pela necessidade de lenha. Num país com infra-estrutura deficiente na área de energia, boa parte da população precisa de lenha para cozinhar e se aquecer nos meses de frio. Um relatório da ONU informava que, no ano de 1989, para cada 9 mudas de árvores plantadas no Quênia, 100 eram derrubadas.

O desflorestamento acelerava a desertificação do solo, a perda de biodiversidade, a morte dos rios e nascentes, o desaparecimento de animais que passaram a buscar refúgio em outras áreas distantes, e cada vez mais aumentava a dificuldade de achar lenha.

O Cinturão Verde reverteu o processo de destruição das poucas áreas verdes e promoveu o plantio de 30 milhões de mudas de árvores no Quênia, gerando emprego e renda. “Quando plantamos árvores, plantamos sementes de paz”, afirmou Wangari Maathai, reforçando um dos princípios do desenvolvimento sustentável, que é aquele que compatibiliza o ganho econômico com os benefícios ambientais e sociais.

À frente do Cinturão Verde, a doutora Maathai formou desde 1992 dez mil pessoas em cursos de capacitação. Criou também a Rede Africana Verde, que disseminou suas práticas pelo continente formando lideranças em 15 países africanos.

O reaparecimento das florestas evita o aumento dos índices de pobreza e miséria, que precipitam as estatísticas de violência. A organização do Prêmio Nobel lembrou que “mais do que simplesmente proteger o meio ambiente que existe, a estratégia de Wangari Maathai é assegurar e fortalecer a própria base para o desenvolvimento ecologicamente sustentável.”

Da distante Suécia, da gélida e rica cidade de Estocolmo, a comissão julgadora do mais importante prêmio do mundo resgatou a história desta mulher, que ninguém conhecia, e que graças ao Nobel da Paz, passa a ser referência. Viva Wangari Maathai.

André Trigueiro é jornalista com Pós-graduação em Gestão Ambiental pela COPPE/UFRJ, Professor e criador do curso de Jornalismo Ambiental da PUC/RJ, autor do livro “Mundo Sustentável – Abrindo Espaço na Mídia para um Planeta em transformação” (Editora Globo, 2005), Coordenador Editorial e um dos autores do livro “Meio Ambiente no século XXI”, (Editora Sextante, 2003).

 

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