Congresso quer driblar STF para liberar a vaquejada

 

Por Bruno Calixto

Fonte: Época – Blog do Planeta

 

No começo de outubro, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou uma lei do estado do Ceará sobre a vaquejada – um festival comum na região Nordeste em que vaqueiros montados tentam derrubar um boi puxando-o pelo rabo. Por 6 votos a 5, os ministros consideraram a prática inconstitucional por causa dos maus-tratos aos animais. Segundo o ministro Marco Aurélio Mello, os laudos mostravam consequências nocivas à saúde dos animais: fraturas nas patas e no rabo, ruptura de ligamentos e vasos sanguíneos, eventual arrancamento do rabo e comprometimento da medula óssea. Também os cavalos, de acordo com os laudos, sofriam lesões.

Apesar de ser uma questão relacionada ao Ceará, na prática a decisão do STF passa a ser aplicada em todo o país. Dessa forma, a vaquejada está proibida no Brasil. Atividades similares, como o rodeio, também estão na mira da Justiça. Isso fez com que parlamentares favoráveis à vaquejada articulassem dois Projetos de Lei para tentar driblar a decisão do Supremo.

Primeiro, eles aprovaram um Projeto de Lei que transforma a vaquejada e o rodeio em “manifestações da cultura nacional e de patrimônio cultural imaterial”. Esse projeto (PLC 24/2016) foi apresentado pelo deputado Capitão Augusto (PR-SP), já passou na Câmara e no Senado, e aguarda a sanção presidencial. Ou seja, se o presidente Michel Temer sancionar a lei, ficaremos na curiosa situação em que a vaquejada é ao mesmo tempo inconstitucional por maus-tratos aos animais (segundo o STF) e uma manifestação cultural brasileira a ser preservada (segundo o Congresso).

O segundo projeto, a PEC 50/2016, foi proposto pelo senador Otto Alencar (PSD-BA). O texto altera o artigo 225 da Constituição, que proíbe crueldade com animais, adicionando um parágrafo para dizer que “não se consideram cruéis as manifestações culturais”. Assim, a PEC dribla a decisão do STF e libera vaquejada, rodeios e demais atividades que possam envolver animais, precisando para isso apenas uma regulamentação que ateste o bem-estar dos animais envolvidos. Não está claro como que se atesta o bem-estar de um animal ao mesmo tempo que permite que ele seja agarrado e derrubado pelo rabo.

A PEC 50/2016 tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, e recebeu parecer favorável do relator, o senador José Maranhão (PMDB-PB). Maranhão argumenta que a vaquejada constitui uma manifestação cultural do modo de vida do vaqueiro e do peão, define a prática como um esporte e diz que, juntos, a vaquejada e o rodeio movimentam mais de US$ 3 bilhões na economia brasileira. O relatório também diz que a vaquejada não provoca maus-tratos aos animais. “O regulamento da vaquejada veda qualquer tipo de agressão ao animal, sendo inclusive causa de desclassificação tocar outras partes do boi que não sejam a cauda durante a competição, salvo quando for para evitar a queda do vaqueiro. Ademais, devem ser disponibilizados no local das provas água e alimento para os animais, em quantidade e qualidade que garantam seu bem-estar. Há tempos já não é tolerada a agressão aos animais com esporas, rosetas, choques elétricos; antes, durante e após a competição esportiva.”

O relatório aguarda realização de audiência pública antes de ser votado na CCJ. Enquanto isso, movimentos de defesa dos direitos dos animais se mobilizam. Há uma série de manifestações marcadas para o domingo (27).

 

 

 

Postado por Daniela Kussama