Enxergando além das boas ideias

André Trigueiro, do "Cidades e soluções", em estante é de madeira de demolição

Lilian Fernandes

Na casa de André Trigueiro, os móveis são de madeira de demolição. O carro ele não lava, para não gastar água. Responsável pelo premiado “Cidades e soluções”, da Globo News, o jornalista tornou-se referência quando se trat a de questões ambientais. Coordenador do livro “Meio ambiente no século 21”, autor de “Mundo sustentável” e professor do curso de jornalismo ambiental da PUC-Rio (criado por sugestão dele), Trigueiro contou ao GLOBO que já foi convidado para falar de meio ambiente até em missa de domingo. E topou.

 

O GLOBO: Como você começou a se interessar por ecologia?

ANDRÉ TRIGUEIRO: Tenho clara na memória a Rio-92. Estava cobrindo os eventos paralelos fórum global, no Aterro. Havia ONGs do mundo todo; o Dalai Lama estava lá; vi um canadense de 9 anos fazer um discurso sobre a água. Aquilo tudo mexeu comigo. Percebi que o assunto não tinha dono. Vi que não se podia pensar em meio ambiente como bichinho e floresta. Era preciso discutir um projeto de civilização, um modelo de desenvolvimento. Terminava o expediente e ficava lá, xeretando. Comecei a procurar cursos, pessoas e livros. Hoje recebo convites inusitados, mas recompensadores, como o de um padre de Itaquera (SP) que me botou para falar de meio ambiente durante a missa de domingo. Também falei para 200 detentos do Rio que vão fazer curso técnico de reflorestamento.

 

Em casa, que atitudes você toma em defesa do meio ambiente?

TRIGUEIRO: Quando eu e minha mulher fomos comprar móveis para a sala, eu perguntava: “Qual a origem da madeira?”. Optamos por madeira de demolição. Sai mais caro, mas essa madeira, antes de vir para cá (aponta sua estante), não era árvore.Uso lâmpadas fluorescentes. Meu automóvel é motor flex, mas só boto álcool, porque aprendi com o pessoal da Coppe (instituto de engenharia da UFRJ) que, embora ele também polua, quando você planta de novo a cana, seqüestra o carbono.Em vez de manter os aparelhos eletrônicos da minha casa em stand-by, comprei um filtro de linha e deixo tudo desligado: economizo 20% de energia. Os livros que eu lancei são de papel reciclado. Uso máquina de lavar uma vez por semana. Não lavo meu carro: se tem estiagem, ele fica sujo. Outro dia, vi da janela um car a perseguindo uma folha de amendoeira com uma mangueira: me controlei para não me meter. Nessa área ambiental, a gente fica chato.

 

O “Cidades e soluções” foi uma evolução natural dessa sua preocupação ambiental?

TRIGUEIRO: Fiz um “Cidades e soluções” em 2004 e, agora, a série. A gente não mostra boas idéias, mas boas práticas. Em outubro de 2006, fizemos uma edição com o tema neutralização de carbono e decidimos neutralizá-la. Este ano, todos os programas passaram a ser neutralizados.A rodoviária Novo Rio encomendou o projeto de um sistema de coleta de água da chuva depois de ver um programa; o senador Tião Vianna fez um projeto de lei inspirado no programa “Compras públicas sustentáveis”; uma professora de Novo Hamburgo (RS) me mandou textos que seus alunos fizeram a partir do programa.

 

O que você acha do tratamento dado aos problemas ambientais na televisão?

TRIGUEIRO: A gente ainda não descobriu um tratamento à altura dos problemas ambientais.No futuro, acho que esta questão estará na ficção da mesma forma que outros temas atuais, como a violência.